Regulação dos média em democracia: Experiências e modelos no caso português
Os quadros de ação, mentais, culturais e sociais das comunidades organizam-se simbolicamente nos e através dos média. Enquanto mediadores e formadores de símbolos e construções mentais, ao nível individual e coletivo, os média moldam a nossa forma de ser e de estar no mundo. A globalização e as novas tecnologias desafiaram as políticas e a regulação dos média. Reequaciona-se o papel dos Estados, que persistem na arquitetura regulatória através das entidades administrativas independentes, num contexto da intensificação dos debates políticos e académicos (nacionais e internacionais) sobre a difusão dos centros de poder e a partilha de responsabilidades numa horizontalidade e complementaridade mútuas. Concebemos a regulação à luz da media governance, convocando para o processo atores e mecanismos, formais e informais, externos e internos aos média, que fazem parte do edifício regulatório e que se procuram complementar no estabelecimento de padrões, na regulamentação de condutas e na verificação dos (in)cumprimentos de forma a responsavelmente responsabilizar accountable media e contribuir para a construção/consolidação de sociedades democráticas plurais, participadas e inclusivas. Esta investigação procura compreender a regulação dos media em Portugal, questionando as relações de poder subjacentes às suas lógicas. São três os eixos que a guiam: 1) enquadramento supranacional das políticas para os média e da regulação; 2) análise longitudinal dos reguladores portugueses desde a instauração do regime democrático; e 3) estudo do modelo da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), questionando as suas virtualidades e limitações. Recorrendo a entrevistas semiestruturadas e a análise documental, concluímos pelas influências do poder político e dos média na regulação e pela instrumentalização da regulação pelo poder político ao longo dos anos, utilizada como utensílio de ensaio e não na procura sustentada de resolução de problemas e de lidar com os desafios. As nossas reflexões finais sugerem uma relação inversa entre as faces visível e invisível das relações do poder político e dos média nas lógicas da regulação: se os indícios apontam preponderância da face visível no caso do poder político, inversamente evidenciam o predomínio do poder invisível dos média, num registo mais sofisticado e escamoteado. Acompanhando a tendência europeia do final dos anos 1980 para a constituição de entidades administrativas independentes, o Estado tem atribuído importância à regulação dos média e o modelo da ERC apresenta como caraterísticas a fundamentação e consistência legal, apesar de se identificarem limitações e indícios contrários à transparência da lógica democrática e à autonomia do regulador e de exposição a pressões exteriores.